Poços são tão fundos assim?

Poços são tão fundos assim?

Uma análise do Alambrado sobre a queda do Paulista para a quarta divisão estadual que aconteceu neste domingo (09).

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Aos mais antigos, era prática comum atirar pedras para tentar descobrir a profundidade de um buraco. Nada de lanterna, nada de celulares. Quando a visão não ajudava, quem ajudava era a audição. Quanto mais tempo para tocar o solo, mais fundo.

Mas para quem não tem a experiência de descer nesses lugares, o fundo sempre vai parecer menor do que realmente é. Faltará um parâmetro para definir se aquele intervalo entre sons é suficientemente curto, ou potencialmente longo, e consequentemente perigoso.

Faltava essa experiência ao Paulista. Agora, não falta mais. O rebaixamento sacramentado neste domingo (09), à Segunda Divisão do Paulistão, leva a tradicional equipe de Jundiaí ao mais fundo degrau do futebol brasileiro para os times do estado de São Paulo.

Troca-se a insegurança triste, mas alentadora, de imaginar se a equipe irá ou não conseguir se manter naquela divisão no próximo campeonato, por aquela de especular se haverá ou não futebol no próximo ano.

Em seus 108 anos de história, o tradicionalíssimo Paulista jamais esteve na Segunda Divisão do estado, o equivalente ao quarto escalão do futebol profissional.

Como se não bastasse, passa pela vergonha de ver seu estádio ser leiloado. O recente tombamento às pressas por parte da Câmara Municipal impede a demolição, mas não soluciona a progressão aritmética das dívidas do clube.

Paulista foi rebaixado para o quarto e último escalão do futebol estadual (Foto: Gustavo Amorim)
Paulista foi rebaixado para o quarto e último escalão do futebol estadual (Foto: Gustavo Amorim)

O drama jundiaiense é ainda mais cruel ao lembrar de um passado não tão distante assim. Entre 2004 e 2006, há pouco mais de dez anos, a equipe viveu seu auge. Finalista de Paulistão, campeã da Copa do Brasil, participante da Libertadores e, por alguns minutos, um integrante da Série A. Depois disso, queda livre.

Não, não há mais rebaixamento. Mas existe ainda um último passo, pior e definitivo: fechar as portas. E é uma possibilidade real, mais do que nunca.

Está errado quem culpa somente as diretorias, mesmo com imensuráveis parcelas de incompetência. Até o torcedor tem culpa, ainda que menor. Não aquele que jamais abandonou, como os quase dez que estiveram em Osasco para testemunhar o novo rebaixamento. Ou os 548 que tentaram empurrar o Galo em Jundiaí diante do Comercial na última semana.

Mas sim aquele que só aparece na maré baixa, incluindo o autor do texto. Que ajudou o Jayme Cintra ter lotação máxima diante do Batatais na semifinal da Copinha deste ano, com entrada franca e público de quase 15 mil, e que depois sumiu.

Abismal a diferença numérica para os 548 do último duelo da equipe em casa na Série A3. Onde estavam os outros 14.452?

A cada insucesso, a cada obstáculo, a cidade deixou de abraçar o time. Acostumou com um certo patamar, e de repente, estar lá, voando tão alto, não era mais tão novidade assim. Caiu? Que coisa ridícula! Era obrigação não ter caído. E agora é obrigação voltar. O protesto é deixar de assistir. E exigir de longe. Cobrança de time grande, público de time pequeno.

Como investir em um clube afundado em dívidas trabalhistas, que não possui qualquer lucro com venda de ingressos ou de produtos, com receita publicitária intermitente, já que sua visibilidade é baixa e negativa, e cuja única renda vem de alguns trocados da Federação e de empréstimos bancários? Qual seria o retorno, mesmo que a longo prazo?

A conta não fecha, e, nessa toada, nunca fechará.

Se há uma flor no deserto em meio a isso tudo, é de que haverá tempo. Caso exista um novo projeto, desta vez sério, será permitido errar à vontade antes de acertar. Aprender com os erros. Afinal, a única pressão existente é a de alcançar a zona de classificação.

E, quando acertar, a mesma cidade que abandonou irá voltar. O gostinho de brigar por algo positivo, mesmo que em um torneio de última categoria, está ausente na memória dos jundiaienses. A própria Copa São Paulo deste ano foi exemplo disso.

Não é preciso mais usar uma pedra para imaginar o quão fundo é o poço. Mas é preciso de inteligência e, principalmente, de ajuda para sair dali.

Se a dúvida anterior era sobre o intervalo entre o lançar da pedra e o contato com o solo, agora a dúvida é se alguém ouvirá os gritos de socorro que vêm lá de baixo.

E se ouvir, quantos ignorarão?

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