A carreira do gênio da folha-seca como técnico

A carreira do gênio da folha-seca como técnico

Craque com a bola nos pés, Didi também ganhou destaque como treinador

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Eternizado pela alcunha de Didi, Waldir Pereira (1928 – 2001) teve duas importantes carreiras ligadas ao futebol. A primeira foi como um dos maiores jogadores que o Brasil já concebeu em toda a sua tradicionalíssima história, enquanto a outra foi como técnico. Embora tenha sido relativamente longa, a segunda ocupação nunca alcançou o mesmo sucesso da anterior.

Para dar uma noção da grandeza do meio-campista dentro do esporte, ele foi bicampeão mundial com a Seleção Canarinho e craque da Copa de 1958, na Suécia. Seu nome também integra a lista dos 20 melhores futebolistas do século XX, segundo a Federação Internacional de História e Estatísticas do Futebol (IFFHS, na sigla em inglês).

Em virtude de sua elegância, Didi recebeu os apelidos de “Mr. Football” (Senhor Futebol), dado pela imprensa europeia, e de “Príncipe Etíope de Rancho”, elaborado pelo jornalista e dramaturgo Nelson Rodrigues. Com a camisa do Brasil, disputou três Copas do Mundo (1954, 1958 e 1962) e fez 20 gols em 68 partidas oficiais.

Como se não fossem suficientes todas as distinções acima, ele foi o autor do primeiro gol no Estádio do Maracanã e inventor da “folha-seca”. Essa famosa técnica consiste em chutar a bola com efeito para fazê-la cair de maneira repentina e imprevisível, tal qual uma folha desprendendo-se da árvore em um dia de outono.

Ídolo do Fluminense e do Botafogo, Didi também atuou na Espanha, onde teria sofrido um boicote idealizado pelo argentino Alfredo Di Stéfano, seu companheiro no Real Madrid. Fato é que o meia não conseguiu se adaptar no elenco merengue e voltou à Estrela Solitária. Antes de se aposentar, ainda jogou no São Paulo e no Veracruz-MEX.

As façanhas protagonizadas dentro de campo pelo Príncipe Etíope, em resumo, são célebres entre os torcedores que se interessam pela história do esporte nacional. Mas, por outro lado, não são tantos os que conhecem a carreira dele como treinador.

Em 1962, após ganhar o bicampeonato mundial com a Seleção no Chile e o Campeonato Carioca com o Botafogo, Didi transferiu-se para o Sporting Cristal-PER, equipe na qual, além de jogar, desempenhou a função de comandante até 1964.

Com a decisão de pendurar as chuteiras em 1966, passou a dedicar-se integralmente à carreira de técnico. Como passo inicial, retornou ao Peru e assumiu o Sporting Cristal. O primeiro título não tardou a chegar. Em 1968, o time de Lima dividia a liderança com o Juan Aurich e venceu o jogo extra por 2 a 1, garantindo a taça.

Didi (Foto: Reprodução)
Na Seleção do Peru, Didi alcançou as quartas de final da Copa de 1970 (Foto: Reprodução)

Em função do rápido sucesso no que diz respeito a clubes, Didi foi designado como treinador da seleção peruana em 1969. Nas Eliminatórias da América do Sul para a Copa de 1970, os Incas surpreenderam e lideraram o grupo de Argentina e Bolívia, voltando a participar de um Mundial após 40 anos de ausência.

Na primeira fase no México, a equipe ganhou da Bulgária, por 3 a 2, venceu Marrocos, por 3 a 0, e perdeu para a Alemanha Ocidental, por 3 a 1. Com o segundo lugar confirmado, avançou às quartas de final do torneio. O adversário que cruzou o caminho de Didi foi, por ironia, justamente o Brasil, com o qual ele havia alcançado e dado tantas alegrias.

A seleção orientado por Mário Jorge Lobo Zagallo eliminou os peruanos ao batê-los por 4 a 2. Na sequência, venceu a semifinal contra o Uruguai, por 3 a 1, e a final diante da Itália, por 4 a 1. Com o feito, o país tornou-se o primeiro a ganhar o Mundial três vezes e assegurar a posse definitiva da Taça Jules Rimet.

Depois da melhor participação do Peru em Copas, competição durante a qual apresentou um futebol de qualidade e ofensivo, Didi deixou o cargo e começou a treinar o River Plate. Mas não conseguiu adaptar os Millonarios à sua filosofia nem obter grandes resultados, somando 37 vitórias, 21 empates e 21 derrotas em 79 jogos.

Ainda por cima, as contratações não renderam como esperado e o “jogo bonito” não se concretizou totalmente no Monumental. Um dos pontos positivos de sua passagem por Buenos Aires foi o uso de jogadores das categorias de base. Ele promoveu Norberto Alonso, Juan José Lopez e deu continuidade ao jovem Reinaldo Merlo, que viriam a tornar-se três dos maiores ídolos da história do clube.

Didi (Foto: Reprodução)
Após deixar a Argentina fora do Mundial no México, Didi foi para o River Plate (Foto: Reprodução)

Sem brigar por títulos, Didi migrou em 1972 ao trocar a Argentina pela Turquia, onde permaneceu até 1975, no Fenerbahçe. A mudança de ambiente parece ter sido benéfica para o treinador, que conquistou dois campeonatos turcos, um sobre o Besiktas (1973/74) e outro diante do Galatasaray (1974/75), além da Supercopa da Turquia contra o Besiktas (1974/75).

Com nove anos de experiência no futebol internacional, ele encerrou outro ciclo e voltou ao Brasil em 1975 para dirigir o Fluminense, na fase em que o time das Laranjeiras era conhecido como Máquina Tricolor. Uma derrota do Vasco o tirou da equipe e deu lugar a Paulo Emílio, que seria campeão carioca. Em 1976, Emílio foi substituído por Mário Travaglini, que faturou o bicampeonato.

Então, Didi mudou-se para o Al-Ahli da Arábia Saudita (para todos os efeitos, existem o Al-Ahli dos Emirados Árabes Unidos e o Al-Ahly do Egito), onde assumiu o atual campeão nacional e permaneceu entre 1978 e 1981. Em 1979, foi campeão da Copa do Rei.

Depois da passagem pelo Oriente Médio, voltou ao Brasil em 1981 para comandar o Botafogo, clube pelo qual havia se apaixonado. O período no alvinegro foi curto. Em 1982, rumou para Minas Gerais e orientou o Cruzeiro, porém não levantou troféus. Em 1984, aos 55 anos, submeteu-se a uma operação na coluna que o afastou do futebol.

Duas temporadas depois, ele retomou suas atividades e teve sua última passagem pelo Peru. No Alianza Lima, um dos clubes mais populares do país, conseguiu reerguer-se. Os Aliancistas montaram um grupo competitivo e chegaram com certo favoritismo em relação ao título, mas perderam a decisão para o San Agustín.

Foto: Reprodução
O meia Didi com o uniforme do Botafogo, clube pelo qual se apaixonou (Foto: Reprodução)

Com o vice-campeonato nacional, o técnico saiu do Alianza Lima no mesmo ano. Ficou longe dos campos até 1989, quando voltou à sua terra natal e assumiu o Bangu. Em Moça Bonita, não repetiu o sucesso que alcançou no exterior. Após tantos anos dedicados ao esporte, despediu-se sem conquistas, porém com um currículo invejável.

No dia 12 de maio de 2001, devido a complicações provocadas por um câncer no fígado, Waldir Pereira nos deixou órfãos de um dos maiores craques da história. Faleceu em um hospital no Rio de Janeiro, ao lado da esposa e de suas quatro filhas. Velado no Botafogo, deixou saudades no mundo inteiro. E o futebol, com sua ausência, ficou mais preto e branco, assim como a camisa 8 que ele tanto vestiu.

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